FEIRAS E PRAÇAS NA IDADE MÉDIA |
A praça era um espaço público e polivalente por excelência, sempre frequentada quer por moradores quer por forasteiros. As praças tendiam a ser cada vez mais, palcos preferenciais de alguns rituais urbanos.
Habitualmente, em frente à igreja ou à Casa da Câmara eram locais muito frequentados por quem acorria a esses edifícios. À Casa da Câmara convergiam diariamente muitos habitantes que tinham de tratar dos mais diversos assuntos, desde a licença de venda à resolução de um conflito pela posse de um pedaço de terra.
Na Idade Média era ponto assente que todos os actos comerciais deviam realizar-se pacificamente e à vista de toda a gente, sendo que existia a garantia de “paz da feira” e o carácter público do mesmo.
A praça foi o herdeiro dos suq muçulmanos, (conjunto de ruas parcialmente cobertas onde se vende de tudo). Os açougues situavam-se nas praças onde se vendia a carne de talho e o peixe do mar. No chão da praça, em bancas ou tendas desmontáveis vendia-se de tudo desde pão cozido e sobretudo muita, muita gente que regateava e gesticulava.
Alpendres, arcos e portais serviam de moldura a este quadro vivo, para além das ricas casas de um ou dois pisos e no rés-do-chão das mesmas, ficavam as tendas dos mercadores de panos, das especiarias, dos ourives, dos tosadores, dos correeiros, dos sapateiros e outros oficiais que exponham os seus produtos em poiais ou tabuleiros.
Era na praça que os serviçais se ofereciam para trabalhar e eram contratados, que as mulheres da mancebia angariavam clientela. Os mendigos e estropiados que nada tinham a vender, expunham a sua miséria à compaixão dos que passavam e ofereciam-lhes a troco de uma esmola a oportunidade de ganhar o céu. Os ladrões e vagabundos limitavam-se a espiar aguardando a ocasião propícia para extorquirem dinheiro. Os moços jogavam às cartas e aos dados o que os tornava larápios, tafuis e arrenegadores.
Sendo um espaço altamente polivalente, tem também a sua função pública e judicial. Nesta estava presente a picota e o pelourinho e os edifícios da casa da Câmara e a cadeia e nalguns casos pelo campanário ou a torre do relógio. O pregão era lançado na praça e o facto de se dizer em praça significava anunciá-lo publicamente.
Aqui se situava o paço dos tabeliães onde se lavravam as escrituras, cumpriam-se as formalidades requeridas antes do emprazamento de uma propriedade, o pregoeiro do concelho devia dar três voltas à praça com um ramo verde na mão apregoando a dita propriedade. Se aparece candidato, deveria meter-lhe na mão o ramo verde dirigindo-se ambos ao paço dos tabeliães onde formalizavam o contrato.
Açoites, empicotamento, enfreamento de mulheres ditas “bravas” e mesmo as mutilações eram castigos banais no pelourinho. Eram também na praça que os justiçados de baraço ao pescoço e mãos atadas iniciavam o seu percurso pelas ruas da cidade acompanhados do pregoeiro que anunciava a razão do castigo.
Os presos da cadeia, que ficaria virada para a praça, por baixo da casa da câmara, podiam através das grades, ver e ser vistos e até dialogar com os transeuntes, mantendo de certo modo uma relação normal com a sociedade envolvente.
A atracção da praça era a sua função festiva. As tavolagens e os jogos de azar aceites no séc. XIV e depois proibidos, os espectáculos de saltimbancos e jograis, os momos e as danças, os jogos de canas e as corridas de touros realizavam-se com grande frequência.
A praça era o lugar de encontro entre a cultura erudita e a popular, vivia-se intensamente a festa, momento único de sociabilidade urbana.